sábado, 1 de junho de 2013

Quando olho para o meu passado, encontro uma mulher bem parecida comigo - por acaso, eu mesma - porém essa mulher sabia menos, conhecia menos lugares, menos emoções.


Não sei quando deixei de ser criança, sequer se deixei de sê-la. Um dia fui em tamanho menor, hoje moro escondidinha dentro de um corpo que cresce sem que a areia o balde e a pá percam de todo o significado das construções que o mar derruba com umas ondas capazes de galgar os muros que se constroem na frente, como se o forte pudesse guardar tudo o que há para ser guardado. Oh, disparate maior. Há criança nova a nascer cá de dentro e cá de fora, até porque a implosão permite-nos o sermos para sempre o que quisermos ser no instante, e eu tenho dias em que sou exactamente a que já cresceu, antes de crescer. A adultez morre várias vezes aos bocadinhos pequeninos que deixam sentir um colo que me cheira a mãe ou um conto que me sabe a avó . Se a adultez não morresse nunca eu por esta altura já sabia que um lenço não pode ser uma capa de uma princesa encantada ao redor de um castelo tão alto, mas a verdade é que não sei. Gosto de ondas grandes, mares mortos não são para mim. Sou capaz de me deitar num brinquedo aquático e de me baloiçar até que a criança me vire e o roube, para fazer a corridinha da onda até à areia. Costumo chegar em segunda, tremenda falta de jeito. Engulo água, sempre, fatal como o destino. O destino é qualquer coisa na qual não acredito porque ainda não cresci o suficiente. Diz quem sabe que nos persegue de perto e nos sopra para dentro do corpo o que bem lhe aprouver. As crianças correm atrás do que querem, caramba, há lá destino que as pare. Mesmo quando o que querem não existe, não possa ser, não se possa comer ou não se possa ter.